segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Touch Me

     Dia desses vi Elena. Estava fraca, pálida. Largada no sofá com os olhos fundos e dizendo que queria morrer naquela noite. Sentei no chão perto dela e em silêncio iniciei a fita que estava pronta pra rodar no vídeo cassete. Era ela dançando de camisola. Rodopiava por todo o quarto como se fosse um palco. Sua irmã a olhava de longe como se Elena fosse uma criatura fantástica de seus sonhos de criança. Lentamente, do sofá, senti suas mãos deslizando sobre meu cabelo ondulado. Continuamos em silêncio por um bom tempo até que, quase que sussurrando, me perguntou o que eu estava fazendo ali. – Sendo a única testemunha de sua morte – respondi. Lágrimas desciam por seu rosto. Havia um lencinho rosa ao lado da televisão e nele tinha um ursinho bordado junto ao nome de sua irmã. – Era dela? – perguntei. – Não... É pra diminuir a saudade. – disse com voz rouca. Aproximei-me de Elena fui secando suas lágrimas. – Estou oca. E o que mata é essa angústia! Eu sempre tenho que esperar! Até a morte gosta de me ver aflita!
     Quem a conheceu jamais se esquecerá de seus olhos vivos e brilhantes. Ela era do tipo de mulher que arrancava sorrisos de sua plateia só de estar ali, presente. Nos tempos de escola todo mundo que eu conhecia era apaixonado por Elena. Inclusive eu, é claro. E por ironia fui o escolhido para vê-la caída. A morte nunca combinou com ela, pelo contrário. Creio que não encontrarei pessoa mais viva e intensa. Quando a vi naquele estado sabia que não havia nada a ser feito. – Está um pouco frio, vou pegar umas cobertas. – Falei. Quando voltei ela estava soluçando. Coloquei o cobertor por cima dela e, olhando nos meus olhos, me perguntou: – O que é que te mantém vivo? – Ter esperança de que tudo melhora. De que os ciclos se completam. – falei. – E quando o ciclo termina e não há como melhorar?
       Sempre fui péssimo em consolar pessoas ou tirá-las de tristeza profunda. Sempre achei que em situações assim não há como compreender uma dor que não sinto ou mal posso imaginar. Deitei no chão ao seu lado e segurei sua mão. – Estou com sono. – ela disse. – Descanse. Amanhã é outro dia. – falei. Permaneci algum tempo olhando para ela. Esperei-a dormir e em seguida adormeci também. 
      Não houve outro dia para Elena. Quando o sol nasceu, seu corpo estava frio. Seu rosto esboçava um sorriso. Era como se ela estivesse feliz por não ter mais que esperar pela morte. Seu ciclo estava completo. Seu celular fez um barulho de sininhos e começou a tocar Turn to Water. Era o despertador que estava programado para as 7:00am. Levantei, liguei para o hospital que ela periodicamente era internada, beijei seu rosto e virei água. Escorri para dentro do chão de sua sala e de lá não saí mais.
      E a música ainda ecoa em minha cabeça... touch me... touch me...
      I turn to water...


Gabriel Lopes Sattelmayer






*Texto inspirado no documentário Elena. 

domingo, 1 de setembro de 2013

Pra você saber

Pra você saber
Que todos os pares de rimas poéticas
São forçadas
Burras e patéticas,
Parto ao meio a minha alma
E te ofereço
Como um pedaço de bife
Para que me devore em um segundo
E que vomite
Todas as vírgulas e pontos
Que nos são cabíveis.
E ao final das contas
O que te sobra?
Se parte da razão que perdemos
Nos levasse ao gesto
Que não fizemos,
Das duas, uma:
Deterioraríamos na desgraça dos criminosos
Ou seríamos a parte
Do todo que nos falta.
Contigo eu serei feliz
Até a gente acordar
E se permitir.

Gabriel Lopes Sattelmayer


quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Conversas de noites frias

     Arrepia a pele este frio que me toca. O tempo é daqueles que não se veem pássaros no céu. -“Olá, caros amigos! Ressurgi das cinzas para abençoá-los com o prazer de minha companhia”. Todos estão inundados até os ossos por esse clima ártico. Fumaça, cafés, peles de animais, circulares súplicas e reclamações ardem como febre de início de gripe. – “Trouxe vinho! E do Porto! 400 reais, acreditam? Uma pechincha!”. As horas no frio são lentas, preguiçosas. Um cachorro moribundo se acomoda no tapete da entrada. A menina ali do lado, aquela de dreads toda enrolada em panos coloridos e símbolos da paz, está tão perdida no mundo virtual que parece um zumbi. Completamente vidrada em seu celular. Capaz de reproduzir somente alguns ruídos como: “hum”,”ham”. Deve estar em alguma dessas redes sociais. Patética!
     Me identifico com ela. Ambos somos patéticos! Alheios a qualquer informação que venha de fora, mas sujeitos a pescar o assunto como mágica em seu ultimo suspiro de vida. –“Aí eu já não sei mais o que fazer com ela. É uma vagabunda! E não sai mais do meu pé. Não sei que diabos fiz pra me envolver com essa vagabunda”. -“É... Essas vagabundas são fodas...”. Não imagino quem era a vagabunda da conversa, mas também não me interessava. Aos olhos de Charlie, qualquer mulher que não suportasse seu ciúme doentio e suas crises de carência e fosse cantar em outra freguesia já seria uma legítima vagabunda. E todas as vagabundas SEMPRE estavam aos seus pés. Pela janela conseguia ver a lua. Parecia um grande queijo. Desde criança acreditava que a lua era um queijão. Achava melhor do que ver São Jorge. –“Mas eu também... Perdi o tesão. Meu relacionamento foi como essa cerveja. Estava gelada quando pedi... Agora está quente e sem gás.”. Essa foi demais! – “E com essa, me retiro! Boa noite, pessoal!”.
   Preferia ver São Jorge a ficar mais meia hora ali. Percebo como estou pobre de espírito. Me incomodando com cada coisa besta! Desviei o caminho. Há um gramado perto daqui muito bom de se deitar. Tudo está úmido e gelado. Deito e me encolho no gramado. Por instantes me vejo como o cachorro do tapete deitado em seu mísero conforto. Meus pensamentos se perdem em lembranças e desejos. Naquela noite, como há tempos não fazia, adormeci.



Gabriel Lopes Sattelmayer


segunda-feira, 19 de agosto de 2013

"Será que a minha raiz vai conseguir arrebentar asfaltos, canos e prédios pra sobreviver e gerar frutos?
Sim... Se minha raiz fosse forte, grande... Mas sinto que minha semente nem chegou a brotar direito ainda.
Então... Provavelmente em uma cidade, ela, se brotasse, miúda e doente viveria."  




sábado, 4 de maio de 2013

Feliz Ano Novo!


Aos seus cachos rebeldes eu dedico esta breve palavra
E que não haja distância capaz de calá-la
Pois do lado de cá te acompanho
E aplaudo a cada conquista sua.

Eu, como eterno admirador de seu sorriso,
Jamais permitirei que o ofusquem em minha presença
E que você veja em meu abraço um eterno aconchego
Pois a minha entrega vive enquanto houver amor
E dele não vivemos sem!

Que este ano novo que se apresenta seja revolucionário
E que você morra de amores várias vezes
Que seja intenso cada ato seu
E que explodam  textos e arte a todo instante

Lamento por não poder te ver hoje
Mas deixo esse texto mal escrito, mas sincero
Com um gosto de abraço apertado
Hoje achei uma música em uma pasta que não ouvia há tempos.
Ficará aqui gravado aqui também.

De Gabriel Lopes Sattelmayer

Para Tamires Camargo de Oliveira