segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Exclamação


   Vivendo uma tarde de sexta-feira, estava ele deitado em sua cama sobre o lençol recém comprado estampado de folhas secas, se alimentando do aroma de café que saía da caneca esquecida à beira do criado-mudo e tentando regurgitar todo aquele sentimento repaginado, reescrito e revigorado nas páginas amareladas de seu caderno.
     Do lado de fora, o dia presenteava o garoto enviando para dentro de seu quarto a imagem alaranjada de um início de pôr-do-sol. Era mais uma tarde sob o céu de São Paulo. Mais uma tarde na periferia de seu ser. Foi nesse momento que o garoto, por impulso, arremessou seu caderno contra a parede e correu até a janela. O vidro mostrava seu rosto pálido sobreposto ao brilho intenso do sol que também era refletido pelas janelas dos outros prédios. Tudo brilhava. Tudo refletia. Tudo se mostrava.
     Até aquele momento, o menino acreditava que apenas a presença bastaria para traduzir-lhe a alma e que a voz era desnecessária, pois, para ele, ela não passava de uma auto-afirmação de cunho persuasivo. Mas todo aquele brilho, aquele reflexo, aquele grito alaranjado despertou-lhe um grito visceral seguido de algumas lágrimas que lhe lavaram a gola da camisa. Estava rompido o laço que amarrava sua voz.    

Gabriel Lopes Sattelmayer

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